quinta-feira, 19 de maio de 2011

Reflexão teológica e experiência de Deus


Toda criatura experimenta do Criador sua grandeza infinita, feita, toda ela, fecundidade, ânima, força interior – “que haja vida!”. E de mil modos adapta-se às adversidades esbanjando vitalidade criativa. É como diz Adélia Prado, sempre uma coisa gera, nunca está morta. O que não parece vivo, aduba. O que parece estático, espera. Fazem a experiência do transcendente, fonte de todo o bem, de todo o progresso. Todo ser move-se, constrói/desconstruindo-se, protesta e contesta as estreitezas internas e externas. Sofre, geme, espera ansiosamente a plena comunhão com o Criador, superação de toda a alienação.

Contemplemos a natureza: os carrapichos vão de carona às regiões longínquas e vencem o contratempo das raízes, tornam-se milagrosamente nômades. E se águas superiores, mais frias, garantem melhor a perpetuação da espécie, nos fascinam os peixes voadores, a piracema, não há obstáculo suficientemente forte que os faça voltar. E o ser humano, duplamente frágil, tolhido fisicamente, tolhido psiquicamente, transcende tudo, vence tudo, rompe todos os esquemas que ameaçam sua dignidade. Aprisionado, seu pensamento habita as estrelas, só encontra repouso no coração de Deus. São exemplos de transcendências próprias à cada espécie, sinal de uma experiência possível do mistério envolvente do amor de Deus que desconhece barreiras. 

A experiência de Deus, portanto, não se restringe a um corpo de doutrinas. A reflexão sistemática não é capaz de esgotar todo o mistério, vislumbrar todas as possibilidades, por ser originariamente posterior ao aspecto existencial. Ainda assim, o esforço da teologia em conceituar o que a natureza experimenta como liberdade absoluta, pura transcendência é louvável e indispensável. Nela, a experiência ganha respaldo da inteligência e o ser humano é envolvido como um todo.

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